No auge das férias escolares, os proprietários de salões de beleza irão se deparar com uma novidade. A Lei 13.352/16, que entra em vigor no dia 25 de janeiro, vai regulamentar a relação entre proprietários de salões e colaboradores, abrangendo tanto questões tributárias quanto previdenciárias. A lei divide responsabilidades e prevê a criação de duas partes na relação: "salão-parceiro" e "profissional-parceiro". Com a lei, explica o consultor da Associação Brasileira de Salões de Beleza (ABSB) Marcelo Mattos, os direitos e deveres de salões e profissionais serão formalizados em contrato.
Na prática, afirma o especialista, o proprietário e o profissional-parceiro deverão dividir a receita bruta sobre os serviços prestados, explorando o mesmo espaço. Cabe ao proprietário, no entanto, a obrigação do recolhimento dos encargos previdenciário e tributário. Desta forma, o salão se resguarda de ações trabalhistas, no caso de o colaborador querer reivindicar direitos não devidos na Justiça, e tributárias, já que, assim, evita que o colaborador deixe de recolher os tributos devidos. O proprietário será responsável também pelos serviços de gestão, incluindo escritório, cobrança, manutenção e fornecimento e manutenção de equipamentos. Já o profissional-parceiro será responsável pelo atendimento ao cliente.
Mattos detalha que o proprietário do salão deverá quitar os impostos referentes ao valor bruto da cota-parte que ficou para ele, como empresário, e deve recolher também o tributo mensal de cada um dos colaboradores. Este último será descontado dos valores a receber. O valor da contribuição mensal para o MEI é de R$ 49,90. "Na sua grande maioria, o salão estará enquadrado dentro do regime tributário do Simples Nacional, no qual existem alíquotas específicas de acordo com as faixas de faturamento", destaca. A tabela começa com uma alíquota de 6%, progredindo conforme o faturamento mensal.
Luís Filipe Nazar, advogado associado do escritório Nahas Advogados, ressalta que, devido à complexidade que este tema envolve, "recomenda-se o acompanhamento de um advogado para elaboração e celebração do contrato de parceria". O especialista também reforça a necessidade da contratação de um contador. "Ele vai exercer um papel importante, já que o salão terá a obrigação de reter os impostos."
Segundo Nazar, é importante destacar que a relação de parceria com a nova lei não implica vínculo empregatício ou societário. Na falta de contrato formalizado, porém, configura-se vínculo entre a pessoa jurídica e o profissional de beleza, como manicures, esteticistas e cabeleireiros, mesmo que sejam enquadrados como microempresários ou microempreendedores individuais.
"A lei deixa bem claro as obrigações das partes e afasta a configuração de uma eventual relação de emprego entre profissional e salão, quando o contrato de parceria for firmado. Não havendo o documento, no entanto, a relação poderá ser enquadrada como de emprego, nos moldes da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)", esclarece Nazar.
O JN Studio Hair, salão situado na rua Pamplona, no Jardim Paulista, em São Paulo, possui quatro manicures, três cabeleireiros e dois ajudantes trabalhando a partir de um contrato firmado sob a orientação do Sebrae. O casal de sócios, José Ferreira Filho e Neuza, pagam 60% da receita para manicures e 50% para os cabeleireiros, "porcentual acima do que o Sebrae recomenda", diz Zezé, como é conhecido no setor. O cabeleireiro reforça que nem por isso desconta despesas, como café e itens de produtos de higiene e limpeza. "Até adianto para eles o valor pago pelo cliente com cartão de crédito", enfatiza. Neste caso, Zezé está entre os 63% dos pesquisados pelo Sebrae-SP que adiantam o valor ao prestador de serviço, mesmo sem ter recebido da operadora do cartão de crédito.
Mesmo com mais de 50 anos dedicados ao segmento da beleza, incluindo participação em órgãos de classe visando tanto a regulamentação da profissão como também o reconhecimento da categoria, Zezé diz que ficou surpreso com a nova lei e tem dúvidas em relação à sua efetividade, assim como em como ficarão contratos anteriormente firmados.
"Nenhum contrato deixa de ter validade com a entrada em vigor da lei", orienta Nazar. O advogado destaca que a nova regulamentação traz segurança aos envolvidos na prestação do serviço. Porém ninguém está obrigado a firmar um documento de parceria regulado, e quem não o firmar não será considerado ilegal ou irregular.
Uma das vantagens de seguir a nova legislação é negociar os valores pelos serviços profissionais prestados, garantindo receita maior, como também a possibilidade de livrar as partes de eventuais problemas futuros com o Fisco. Outra questão que será resolvida refere-se ao cruzamento de dados da Receita Federal do imposto sobre o serviço com os declarados no Imposto de Renda, pois ignora-se o fato de que uma parcela do valor do serviço é sempre repassada ao profissional e não fica com o estabelecimento.
Um estudo do Sebrae-SP revela a fragilidade trabalhista do setor. Poucos são os contratados formalmente ou formalizados na figura de Microempreendedor Individual (MEI), sendo grande o potencial de passivo trabalhista. Dos 385 centros de beleza e de estética na capital paulista participantes do levantamento, apenas 30% relataram algum tipo de contrato formalizado e assinado com os profissionais autônomos, 76% deles não são contratados pelo regime da CLT e 48% são MEIs.
A Associação Nacional do Comércio de Artigos de Higiene Pessoal e Beleza (Anabel) aponta que os donos dos salões repassam aos profissionais de beleza entre 30% e 60% do valor dos serviços prestados, porcentual que nenhuma outra categoria recebe. Outro estudo, este da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec) aponta que o setor contabilizava 1,3 milhão de trabalhadores e 600 mil centros de beleza no País em 2015.
Fonte: DCI